domingo, 20 de outubro de 2024

Capítulo 02 – O Homem de Negro.

 Transilvânia – Romênia.

Inverno de 1562.

Narrador.

Era mais uma manhã gélida na pequena aldeia ao noroeste da Transilvânia. Esse inverno tinha chegado para ser um dos mais rigorosos vistos nos últimos cem anos. A aldeia passava por dificuldade, os grãos não tinham rendido o suficiente depois de quase um ano inteiro com pouquíssimas chuvas, e isso havia deixado o gado bem magro.

Mesmo que o dia já tivesse raiado a bastante tempo, quase entrando no período vespertino, o céu estava completamente escuro devido a uma forte tempestade de neve que caía. Toda a aldeia e floresta estava coberta por uma grossa camada de neve branca, tão branca que chegava a doer os olhos. A água também havia se tornado um produto bem escasso, os rios e lagos próximos estavam completamente congelados e o poço da vila também, e o gelo que os cobria estava tão grosso que era quase difícil quebra-lo para conseguir um pouco de água.

Isabella agora era uma pequena criança, que havia completado a poucos meses os seus sete anos! Vivia sozinha com o seu pai, em uma pequena cabana as margens da floresta. Seu pai era um dos caçadores da pequena vila e ela tinha perdido a sua mãe ainda bebê, durante o parto, ou pelo menos era isso o que seu pai falava.

Devido ao verdadeiro acontecimento que resultou na morte da esposa, Charlie não confiava nos seus vizinhos e jamais deixava a filha sozinha na aldeia enquanto ia caçar na floresta. Em sua concepção, a aldeia com a besta e os animais selvagens era mais seguro do que a aldeia com os seus moradores.

Na noite anterior ele tinha avisado a menina que ela iria precisar ir com ele para a floresta mais uma vez, e mesmo não gostando muito de ir, ela apenas balançou a cabeça assentindo. Isabella, não se sentia muito bem na floresta, mesmo que só tivesse ela e o seu pai ali, ela sentia como se estivesse sendo observada e ela não gostava disso. Ela sentia medo! Principalmente durante o inverno!

Após conferir que a filha estava bem agasalhada, deixando praticamente apenas os seus olhos de fora, eles partiram para a floresta.

Isabella sabia muito bem das regras, ela não deveria se afastar de seu pai, e quando ele rastreasse algo, ela tinha que ficar em silêncio. Charlie sabia que seria difícil encontrar algo durante o inverno e principalmente com a neve forte caindo, mas ele precisava arriscar, em pouquíssimo tempo eles não teriam mais nada para comer em casa. Depois de um longo e frio tempo, Charlie havia conseguido rastrear um cervo e Bella começou a seguir o pai em silêncio, agarrada ao seu casaco para se proteger do vento frio, que passava por eles entre as árvores nuas e cobertas pela neve de aparência fofa.

Enquanto seu pai ficava agachado no chão, em silencio, apenas esperando pelo momento certo para apertar o gatilho, Isabella teve a sua atenção atraída por algo se mexendo em um arbusto branco e seco. Ela se afastou apenas três passos do pai, apenas para ver o motivo do movimento, afastando os galhos e sentindo-os gelados, mesmo usando as luvas. Ao afastar os galhos, ela viu um pequeno coelho branco, com o nariz bem vermelhinho, fazendo com que a doce menina, primeiro se sobressaltasse e depois sorrisse para o animal.

Desde pequena, Isabella adorava coelhos, e por esse motivo o seu pai evitava caça-los. Ela tentou levar uma das mãos até o pequeno animal, que não parava de mexer com o nariz, para tentar lhe afagar entre as orelhas, porém, antes que ela conseguisse encostar no pequeno coelho, ele lhe cheirou a mão e saiu correndo e saltitando para longe, para dentro da floresta. E desobedecendo o seu pai pela primeira vez, ela foi atrás do animal.

A menina ia desviando dos galhos pontudos e ria enquanto perseguia o coelho, e essa era a primeira vez que ela entrava naquela floresta e ria. Ela perseguiu o animal até chegar a uma clareira, grande e toda coberta pela neve. Aquela clareira!

No meio da mesma, ela se deparou com uma figura negra parada a poucos passos dela, cuja figura, ao ouvir a risada e os passos da garotinha se aproximando, se virou, fazendo-a parar de rir imediatamente e olhar em volta desesperada tentando ver se via o seu pai e ao perceber que havia se afastado demais de onde ele estava.

Ela estava perdida!

- Oi garotinha. – o homem de preto disse com a voz gentil para não assusta-la. A sua voz era calma, aveludada e levemente doce. Seu belo rosto tinha um semblante gentil, mas isso não impediu Isabella de engolir em seco de novo. Era a primeira vez que ela estava sozinha com outro homem desconhecido e longe de seu pai. – Qual é o seu nome? – ela não respondeu, continuou estática no lugar, sentindo seu corpo todo tremer, ela só não sabia se tremia de medo ou de frio. – Está perdida? – perguntou e ela continuou sem responder. A atenção dos dois foi atraída por algo se aproximando dos pés do homem, era o coelho que Isabella seguia a poucos minutos. – É seu? – perguntou ele se referindo ao animal que cheirava os seus pés. Ela continuou sem responder. – Comeram a sua língua? – questionou erguendo a sobrancelha e ficando estressado por ela continuar sem responde-lo, e mesmo de longe, ele a viu tremer. – Está com frio? – questionou vendo-a abraçar o seu corpo e apertar o casaco em volta de si.

Dessa vez, Isabella respondeu, não com palavras, apenas balançando a cabeça assentindo.

Devagar, principalmente para não assusta-la, ele se abaixou e pegou o coelho que continuava em seus pés e caminhou a passos lentos até perto de onde a menina estava, na entrada da campina, e se agachou a sua frente, entregando-lhe o coelho. Bella segurou o pequeno animal com cuidado, e tirando a sua capa, ela colocou sobre os ombros da garota.

- O senhor não vai sentir frio? – pela primeira vez, ela falou e ele sorriu ao ouvir a voz doce da garotinha.

- Não! Não se preocupe comigo. Cadê os seus pais? – questionou.

- A mamãe morreu quando eu nasci e… - ela olhou para trás, para a floresta. – Eu me perdi do papai. – respondeu. – Ele estava caçando. –

- Onde você mora? –

- Na aldeia. Do outro lado da floresta. –

- Venha. – ele se pôs de pé. – Eu te ajudo a voltar para casa! – ele estendeu a mão.

- Eu não devo aceitar a ajuda de estranhos! – disse dando um passo para trás e se afastando de sua mão estendida.

- E também não deveria falar com estranhos! – apontou. – E se eu quisesse te machucar, já tinha te machucado! – apontou e levantou a cabeça para o céu. - - E daqui a pouco vai cair uma tempestade muito forte e você não vai conseguir voltar para casa e nem encontrar o seu pai. – ele não voltou a estender a mão, mas ela apenas assentiu, aceitando a sua ajuda, e ele apontou para que ela fosse para a floresta.

- De onde o senhor é? – perguntou segurando o coelho entre os braços e começando a andar ao seu lado de volta para o lado de dentro da floresta. – Eu não me lembro de tê-lo visto na aldeia. –

- Digamos apenas que… que eu não moro na aldeia. – respondeu ele com a voz calma e andando a passos curtos para que a menina o acompanhasse. – Digamos que eu moro do outro lado da floresta, não muito distante daqui. – disse simplesmente, andando com as mãos para trás.

- Tem outra aldeia do outro lado da floresta? – questionou confusa. Ela não conhecia nada além do lugar onde morava.

- Não. Não tem outra aldeia do outro lado da floresta! –

- E o que senhor estava fazendo nesse tempo ruim no meio da campina? –

- Você pergunta muito! – rebateu ele rindo, mas não se importava com as perguntas dela.

- Desculpa. – pediu com a voz baixa e olhando para o chão branco. Seu pai volta e meia comentava que Isabella perguntava, e falava, demais.

- Não precisa se desculpas! Eu vim dar uma… uma volta! – deu de ombros simplesmente. – E a senhorita, por que veio para a floresta com esse tempo caçar com o seu pai? por não ficou em casa ou brincando com os seus amigos? –

- Eu não tenho amigos! Eles têm medo do papai! E são chatos! – reclamou torcendo o nariz, o fazendo rir, mas seu riso morreu com um pensamento que surgiu em sua cabeça.

- Eles já maltrataram você? – ela apenas balançou a cabeça assentindo.

- Depois que o papai descobriu, ele brigou com eles e ficou pior, então quando o papai saí, ele me leva junto! – contou.

- Isabella? – os dois ouviram Charlie gritando o nome da filha ao longe.

- Oh… Seu nome é Isabella?! – ela torceu o nariz de novo. – Qual é o problema? –

- Eu não gosto de Isabella! – reclamou. – Eu gosto quando o papai me chama de Bella! Só Bella. –

- Isabella? – seu pai gritou de novo

- Pois bem, Bella, só Bella. – o homem se agachou ao seu lado mais uma vez, após eles chegarem no ponto de onde Isabella tinha se afastado de seu pai. – Quando eles forem chatos com você de novo, ou te fazerem mal, e precisar de ajuda, é só me chamar! –

- Chamar o senhor? Eu nem sei o seu nome. – ele sorriu para ela.

- Edward! – respondeu.

- Isabella? –

- Olha lá o seu pai! – ele apontou para o vão entre as duas árvores e ela olhou para lá.

- Cadê? – ao se virar de novo para onde Edward estava agachado ao seu lado, ela notou que ele tinha sumido, junto com a capa que ela tinha sobre os ombros.

- Isabella! – a voz de alivio de Charlie ao ver a filha lhe atraiu a atenção. – Onde você estava? –

- Aqui. – mentiu quando ele se abaixou a sua frente. – Eu só peguei o coelhinho. –

- Achei que eu tinha te perdido! – ele beijou o topo de sua cabeça. – Venha, vamos voltar para casa, a neve está começando a cair mais forte! –

- Posso leva-lo comigo, papai? – perguntou se referindo ao coelho e Charlie apenas assentiu.

- Claro que pode! –

Os dois voltaram para casa, e mal Charlie fechou a porta atrás de si e a tempestade de neve se tornou mais forte e muito mais fria. Os dias foram se passando e os Swan mal colocavam os pés fora de casa devido ao inverno rigoroso. Os dois praticamente só saíram de casa de novo quando a primavera chegou e a neve começou a derreter, e com o passar dos dias, Isabella acabou se esquecendo do que tinha acontecido naquela campina, e consequentemente se esqueceu do homem que a tinha ajudado a encontrar o caminho de volta para o seu pai.

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